Em decisão inesperada, a Petrobras informou em seu
balanço que encerrou os projetos das refinarias Premium I e II; em
nota, cogitou a possibilidade de retomar projetos de refino em 2025 e
lamentou a falta de parceiros
Passaram-se quase sete anos desde que o então presidente Luís Inácio
Lula da Silva garantiu, em evento no Ceará, a instalação da refinaria
Premium II no Estado, um sonho de cerca de cinco décadas da população
cearense. Depois de muitas idas e vindas, adiamentos e rumores de que a
usina não seria realizada, a Petrobras anunciou, na madrugada de ontem,
que, de fato, o projeto de implantação do empreendimento foi encerrado.
Envolvida em diversos escândalos de corrupção, a empresa divulgou as
suas demonstrações contábeis trimestrais não revisadas pelos auditores
independentes. No documento, afirmava que, no último dia 22 de janeiro, a
companhia decidiu encerrar os projetos de instalação tanto da refinaria
cearense quanto a do Maranhão, a Premium I.
> Desistência do projeto gera perda de R$ 596 mi
"A Companhia, diante dos resultados econômicos alcançados até o
momento, consideradas as taxas previstas de crescimento dos mercados
interno e externo de derivados e da ausência de parceiro econômico para a
implantação, condição prevista no Plano de Negócios e Gestão da
Companhia, PNG (Plano de Negócios e Gestão) 2014-2018, entendeu que
deveria encerrar estes projetos de implantação", anuncia o texto do
documento.
Entre boatos e ações
No ano passado, já havia sido vazado no mercado que a Petrobras iria
adiar os projetos das duas refinarias em virtude de uma desaceleração do
crescimento da demanda de combustíveis no País. Após a divulgação dessa
informação na imprensa, a presidente Dilma se apressou a defender o
contrário, garantindo que os projetos seriam entregues dentro do
cronograma, ou seja, em 2018 para a Premium II e 2019 para o primeiro
trem da Premium I (que seria entregue em duas etapas).
O Diário do Nordeste entrou em contato ontem com a Presidência da
República, mas foi informado pela assessoria de imprensa que o governo
federal não iria se pronunciar oficialmente sobre o assunto.
Acontecimentos
Quando anunciadas, as duas refinarias somavam investimentos de US$ 30
bilhões para sua implantação. Diante da experiência com a instalação da
refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco - que passou de um custo inicial
de US$ 2,5 bilhões para US$ 18,5 bilhões -, a Petrobras decidiu rever os
custos das unidades Premium, em busca de viabilidade econômica
compatível com os preços internacionais para o custo do barril unitário.
Ainda em 2013, a presidente da companhia, Graça Foster, chegou a
declarar que ambas as usinas eram economicamente viáveis, que seus
projetos, então refeitos, tinham alcançado um Valor Presente Líquido
(VPL) positivo. Para conseguir isso, "muitas simplificações" nos
projetos haviam sido feitas. "(Os projetos) estão num nível de
maturidade extremamente alto", afirmou.
Em julho do ano passado, Foster garantiu que, até o fim de 2014, seriam
lançados os editais de licitação para as obras das usinas, o que não
aconteceu. A Petrobras estudava que tipo de modelo iria utilizar para a
construção das novas unidades e, qualquer que fosse o formato, deveria
contar com investidores. "A autorização que nós temos do Conselho de
Administração é de conduzir essas refinarias com parceria", afirmou ela,
em resposta à indagação do Diário do Nordeste, em coletiva no Rio de
Janeiro.
A Petrobras chegou a firmar um memorando de entendimentos com a
sul-coreana GS Energy, apresentada à estatal pelo então governador Cid
Gomes, mas as negociações não avançaram. Havia rumores de que a empresa
estava negociando com parceiros chineses, mas nada foi confirmado.
Foster reforçava apenas que existiam negociações em andamento. No
comunicado anunciado ontem, todavia, a empresa declarou que não
conseguiu parceiros.
Decisão econômica
Por diversas vezes, a presidente da Petrobras afirmou que a decisão
pela implantação das refinarias Premium não era política, mas econômica.
A defesa era de que, diante das perspectivas com a exploração de
petróleo no pré-sal, eram necessárias novas unidades de refino para
processar todo esse óleo, impedindo que o Brasil se tornasse apenas
exportador de petróleo cru e importador de derivados. O Plano Decenal de
Expansão de Energia (PDE) 2023, da Empresa de Pesquisa Energética
(EPE), lançado no ano passado, reforça esse posicionamento, mas pondera
que os investimentos devem ser feitos somente com viabilidade garantida.
"O aumento do excedente de petróleo nacional e a necessidade de
importação de quase todos os principais derivados indicam claramente que
há espaço para ampliação e adequação do parque nacional de refino,
desde que estes investimentos se revelem economicamente viáveis para o
investidor, ou que sejam considerados indispensáveis para a segurança do
abastecimento do País", afirma o documento.
Estado repudia decisão
Ciente do acontecido desde a manhã de ontem, o governador Camilo
Santana passou parte do dia com secretários e, por volta das 21h, lançou
nota repudiando "totalmente" a decisão. "Essa atitude representa uma
quebra unilateral do compromisso firmado com o Estado e configura um
desrespeito da empresa com o povo cearense", diz a nota, informando da
surpresa dele ao receber a notícia. O texto ainda diz que Camilo "cobrou
explicações da Petrobras, conversou com o ministro-chefe da Casa Civil,
Aloizio Mercadante, e solicitou uma audiência com Dilma Rousseff".
Afirmou que "o Ceará cumpriu todos requisitos para a implantação da
refinaria", e encerrou: "o Governo afirma que continuará lutando e
empreendendo todos os esforços para viabilizar este importante projeto".
Projetos podem ser retomados em 10 anos
O projeto da refinaria Premium II está, de fato, encerrado. Assim como
da Premium I. Contudo, em nota enviada na noite de ontem, a Petrobras
afirmou que poderá retomar estes, ou algum outro projeto de refino,
daqui a 10 anos. A estatal, contudo, não se compromete com esta
possibilidade. "Há indícios que nova adição de refino possa se dar a
partir de 2025. Caso nova demanda se confirme para este horizonte,
projetos de adição de capacidade de refino poderão voltar a fazer parte
dos próximos Plano de Negócios e Gestão da Companhia". "Os resultados
econômicos para ambos empreendimentos não demonstraram atratividade até o
momento, mesmo após incorporadas as otimizações de redução de custo de
investimento" esclareceu. A segunda razão é que "o crescimento dos
mercados interno e externo de derivados pode ser atendido pelo aumento
de capacidade que o Promega (Programa de Maximização de Médios e
Gasolina) vem promovendo nas 12 refinarias em operação, adicionado da
Rnest e Comperj, em construção". Por fim, reforça a ausência de parceiro
para a implantação da usina.(SS)
Análise
Será que fomos todos enganados?
Ao longo de tantos anos na edição de Economia, sempre que surgia algum
novo lance em torno da Premium II havia reações de leitores duvidando da
implementação do projeto. Mesmo em meio a todas as dificuldades já
impostas para a concretização de uma refinaria no Ceará, entretanto,
particularmente eu acreditava que um dia ela se tornaria real.
Mas, para mim, esteve sempre claro que faltava uma vontade política
maior que garantiria a realização do projeto e também, em muitos
momentos, a sensação de fragilidade da pressão a partir dos políticos
pela usina. Muitas vezes, surgiram especulações e informações sobre
adiamentos e até desistência da implementação do projeto no Estado. Em
seguida, contudo, alguém de elevada credencial ou a própria Petrobras,
assegurava que a ideia continuava de pé.
Após toda a crise que a estatal vivencia, respinga sobre o Ceará e o
Maranhão um outro capítulo a partir da cena de corrupção que envolve a
maior empresa brasileira. Mesmo considerando o contexto de dificuldade
econômica vivenciado no País fica a pergunta: fomos todos enganados?
Regina Carvalho
Editora da Área de Economia
Sérgio de Sousa
Repórter