A recomendação do Ministério Público do Ceará (MPCE) para o fornecimento
de equipamentos de proteção individual (EPIs) à Perícia Forense do
Estado expôs uma realidade preocupante no Ceará: a Pefoce não está
realizando exames internos nos corpos durante necropsia. De acordo com o
MPCE, chegou ao órgão informação que o procedimento completo foi
suspenso devido à ausência de materiais, como máscara do tipo N95, batas
ou aventais adequados.
Ontem, o MPCE divulgou que a falta destes materiais põe em risco os
funcionários da Perícia Forense a uma eventual contaminação pelo novo
coronavírus e outros patógenos. O MP disse ainda que a não realização do
exame de corpo de delito interno pode prejudicar diretamente na
investigação de um crime, ou até mesmo impossibilitar as autoridades de
desvendarem se determinada morte se tratou de um suicídio.
Na recomendação de máxima urgência direcionada ao governador do Estado
do Ceará e com cópia para a Secretaria da Segurança Pública e Defesa
Social (SSPDS) e Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), o Ministério
requereu entrega de 15 mil máscaras e 21.500 batas ou aventais
manga-longa conforme exigência da Anvisa para este procedimento.
O documento foi assinado conjuntamente por três promotores, dentre eles
Fernanda Marinho, titular da 128ª Promotoria de Justiça de Fortaleza-
Controle Externo da Atividade Policial e Segurança Pública. A promotora
destaca que desde o dia 27 de março a Coordenadoria de Medicina Legal
(Comel) expediu documento orientando médicos peritos legistas a
considerar todo cadáver como potencial infectado pelo novo coronavírus.
"Os exames passaram a não ser realizados desde essa data. Com a
Covid-19, é necessária máscara de um tipo que nunca tinha sido fornecida
antes. Não realizar esses exames é algo gravíssimo e de um prejuízo
incalculável. É preciso que a sociedade saiba que o Estado está
negligenciando o exame de corpo de delito interno que, muitas vezes, é o
único meio para a elucidação de um crime", disse a promotora.
Prejuízos
Durante a pandemia, o número de mortes violentas no Ceará aumentou. Já
são, pelo menos, 850 assassinatos no Estado desde o fim do último mês de
março, início do período de isolamento social. Os corpos das vítimas
dos Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) precisam passar por
perícia e, é neste procedimento, que pode ser encontrada a resposta
sobre quem foi o responsável pela morte.
O MPCE ponderou que nos casos de homicídios dolosos, o Tribunal de Júri
costuma enfrentar dificuldades no que tange à produção de prova
testemunhal. Assim, provas técnicas, como laudos produzidos pela Pefoce,
podem suprir as necessidades dentro de um processo penal.
"A falta de abertura do corpo da vítima, quando da realização do exame
cadavérico, pode causar sérios prejuízos para a investigação criminal,
seja no que tange à determinação da causa da morte da vítima, seja para o
esclarecimento da respectiva autoria e, eventualmente, sobre a dinâmica
do delito ou incidência de alguma qualificadora", destacou o Ministério
Público sobre o exame cadavérico.
Os promotores Fernanda Marinho, Ionilton Pereira e Mathilde Martins
Telles afirmam ainda que a Pefoce tentou adquirir os materiais de
proteção individual no mês de abril, mas não conseguiu finalizar a
compra. "Os representantes do MPCE alertam que o descumprimento
injustificado à recomendação poderá acarretar a adoção de todas as
medidas administrativas e/ou judiciais cabíveis".
Resposta
A Perícia Forense não se manifestou sobre a não realização do exame de
necropsia interna. Apenas informou que possui um estoque de "toucas,
aventais, luvas, máscaras descartáveis de três camadas, dentre outros" e
"este é o material padrão utilizado pelos servidores do órgão". A
Pefoce disse que há uma remessa extra de itens específicos para o
enfrentamento da Covid-19 está em processo de aquisição.
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